terça-feira, 6 de agosto de 2019

Rezadores (2)


Na postagem anterior falei/escrevi que atualmente os rezadores e as rezadeiras estão sumindo dos grandes centros urbanos. Mas dei com a língua nos dentes.

No dia 6 de agosto, a jornalista Juliana Sayuri publicou reportagem intitulada Rezadeiras de Florianópolis se modernizam e querem ser patrimônio cultural (visualização: https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2019/08/06/patrimonio-nacional-as-rezadeiras-de-florianopolis.htm).

O texto faz um relato do trabalho da socióloga Tade-Ane Amorim, coordenadora do projeto "As benzedeiras de Florianópolis: inventariando saberes", que mapeou 16 benzedores ativos na capital catarinense, entre fevereiro de 2018 e janeiro de 2019. Informa ainda que o vereador Afrânio Boppré (Psol) apresentou projeto de lei para que as benzedeiras sejam reconhecidas como agentes de saúde popular, o que já acontece nas cidades de Rebouças e São José de Triunfo (PR).

Fiquei feliz com a novidade, pois significa que nossas raízes culturais estão sendo registradas e preservadas, e, principalmente, que esse tipo de trabalho social popular permanece vivo. Eu já fui em alguns rezadores em Porto Velho,  quando morava lá, sendo beneficiado.

Mais o mais, digamos assim, competente com quem tive contato até agora foi um senhor conhecido por Manga Rosa (ele tinha as faces rosadas), que morava em Barra do Garças - Mato Grosso. Estive lá, salvo engano, três vezes. O homem (no momento, não estou lembrando o nome de batismo dele) sabia aonde as andorinhas moravam.

Simples, como a maioria dos seus colegas, o curador maranhense (nascido em Codó) tinha uma história de vida vigorosa. Desde cedo demonstrou dons premonitórios, que desenvolveu ainda mais com os ensinamentos que lhe foram passados pela mãe. Durante muitos anos gerenciou garimpos de ouro, até que um dia resolveu deixar tudo para se dedicar exclusivamente à cura dos doentes que lhe procuravam.

Além da reza, Manga Rosa usava muitas plantas do cerrado mato-grossense, que conhecia como poucos. Fazia garrafadas onde colocava inúmeras ervas, tais como Unha Dura, Manacá, Cervejinha, Gozadeira e diversas outras. Dizia que nenhuma fazia mal, e que cada uma delas procurava seu lugar no organismo das pessoas.

Na cidade, acredito, provavelmente existem ainda muitas pessoas que foram curadas ou tiverem parentes salvos de algum mal, pois ele também, quando rezava, dava orientações e conselhos, tudo recebido dos "mensageiros" que falavam ao seu ouvido quando atendia no quarto pequeno e modesto da casa onde morava. Um ser do bem. A exemplo das benzedeiras de Florianópolis, Manga Rosa merece um estudo sociológico, que talvez até já tenha sido feito, mas, se existe, desconheço.

Uma vez, dois amigos meus foram visitá-lo. Um deles morava em Barra do Garças e estava levando o segundo. Na saída, aquele que residia na cidade comentou: "Manga Rosa é um bobo, não sabe de nada". No dia seguinte, a segunda pessoa, que iria retornar para seu domicílio, resolveu ir, dessa vez sozinho, até a casa do Manguinha, para se despedir, pois o rezador tinha lhe causado forte impressão. Chegando lá, ouviu: "Olha, diga para seu amigo que bobo é ele".

Sempre dizia que quem curava era Jesus e Nossa Senhora, santa de sua devoção. De outra feita, a família de uma mulher com eclâmpsia tirou-a do hospital, onde tinha dado à luz, autorizada por um dos médicos da equipe, que já conhecia a fama do curador, e levou-a até a casa do Manga Rosa. Ele examinou-a e disse que ia buscar a planta necessária para fazer a cura. Entrou na floresta e após algum tempo de busca localizou um pé de João Brandinho (Ottoniacorcovadensis), que até então não tinha usado, e conheceu que ali estava a solução. Levou folhas e raízes, fez um chá e deu para a paciente, que ficou boa. 

São todas essas coisas.




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