Chegou ao meu conhecimento, via WhatsApp, a
notícia de que tramitou (não sei o ano) na 1ª Vara Cível e Criminal de Tobias
Barreto, município do interior sergipano, uma ação em que um estudante,
representado por sua mãe, pleiteava indenização porque um professor tomou-lhe,
durante a aula, o celular.
Consta no processo que o aluno estava ouvindo
música com fones de ouvido enquanto o educador discorria sobre o conteúdo da
disciplina que estava sendo ministrada. O jovem pleiteou indenização por danos
morais aduzindo que a atitude do mestre lhe causou “sentimento de impotência,
revolta, além de um enorme desgaste físico e emocional”.
O juiz Eliezer Siqueira de Sousa Júnior, ao
prolatar a sentença, indeferiu o pleito autoral, considerando que “não houve
abalo moral, já que o estudante não usa o celular para trabalhar, estudar ou
qualquer outra atividade edificante”. Entendeu ainda o sensato magistrado: “Julgar
procedente esta demanda, é desferir uma bofetada na reserva moral e educacional
deste país, privilegiando a alienação e a contra educação, as novelas, os realitys
shows, a ostentação, o bullying intelectivo, o ócio improdutivo,
enfim, toda a massa intelectivamente improdutiva que vem assolando os lares do
país, fazendo às vezes de educadores, ensinando falsos valores e implodindo a
educação brasileira”.
E disse mais o nobre julgador: “Ensinar era um
sacerdócio e uma recompensa. Hoje, parece um carma. No país que virou as costas
para a Educação e que faz apologia ao hedonismo inconsequente, através de
tantos expedientes alienantes, reverencio o verdadeiro herói nacional, que
enfrenta todas as intempéries para exercer seu múnus com altivez de
caráter e senso profissional: o Professor”.
Tem coisas que são tão sem nexo que parecem
até inacreditáveis. O mais alarmante nisso tudo, a meu ver, não é o aluno dar
as costas à aula para ouvir música. O que impressiona é uma mãe entender que o
filho, nesse caso, tem razão e mobilizar o sistema judicial para defender a
tese absurda de que o monstrinho que ela está criando possuía direito a
indenização.
Fosse esse um país sério, essa criatura
desnaturada seria repreendida severamente quando chegasse em casa contando a
sua façanha, e não amparada. Ainda bem que o caso caiu nas mãos de um juiz com
a cabeça no lugar. Que Brasil é esse que estamos entregando aos nossos filhos e
netos? O que esperar de uma geração que ameaça professores, agride-os e passa
pelas escolas sem nenhuma preocupação em adquirir o que há de mais importante:
estudo?
Sim, existem colégios excelentes, com alunos
dedicados e focados no aprendizado. Mas é uma minoria. Estou falando dos milhões
de jovens entregues à própria sorte por um sistema desumanizado e no qual o elo
mais importante – o profissional do Magistério – está ao Deus dará. Homens e
mulheres abnegados que diuturnamente dão o melhor de si em aulas a rapazes e
moças tristemente desinteressados, porque não conhecem a importância do ensino
que desprezam.
É sabido que em muitos países os professores
são extremamente respeitados e valorizados, e têm autoridade máxima dentro da sala
de aula, a ponto de, no Japão, ser dito de que são as únicas pessoas que não
precisam se curvar diante do imperador (na verdade, eles são os únicos a quem o
imperador retribui a saudação). Não há nação que tenha crescido e garantido
melhor condição de vida a seu povo sem amplo investimento educacional, cujos
resultados demoravam, no mínimo, 25 anos, ou seja, o tempo de uma geração.
Atualmente fala-se que existe um geração
tecnológica, cuja distância de uma para a outra é de apenas 10 anos, tendo
entre suas principais características: a consideração da aprendizagem formal e
informal por meio de dispositivos analógicos e digitais; o ensino em espaços
físicos diferentes e a transparência na forma de ensinar por meio de múltiplas
tarefas (www.revistaeducacao.com.br).
Talvez por isso a historiadora e escritora
Jill Lepore, professora da Universidade de Harvard, em Cambridge (EUA), em seu
livro mais recente intitulado Estas verdades – História da formação dos
Estados Unidos, esclarece: “Uma nação não pode escolher o seu passado, só
pode escolher seu futuro”.
Que futuro estamos escolhendo, na medida em
que, no dizer do juiz Eliezer Siqueira de Sousa Júnior, estamos virando as
costas para a Educação? Que líderes surgirão sem a lapidação iluminada do
conhecimento?
Sinais obscurantistas já estão no ar. Abramos,
pois, portas e janelas para que a luz possa afastar as trevas do mofo da
ignorância e fazer brotar o sadio saber que orienta e conduz ao porvir
virtuoso.