quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Rapidinhas 3




Noite perdida

        Tinha alguma coisa errada. Foi fácil demais. Seu pai nem pensou duas vezes e disse que ela podia ir ao Baile de Gala, o evento mais tradicional da cidade, a noite black tie que todos esperavam ao longo do ano, principalmente as garotas solteiras e os rapazes namoradeiros.

        O velho não gostava de festas. Mantinha vigilância constante em torno de sua filha única. Mandou fazer uma festa de debutante depois de muita pressão da mãe. E agora aceitou de pronto o pedido para ela ir àquela função. Com certeza tinha alguma coisa errada, principalmente porque ele não estaria presente, por motivo de viagem a negócios.

        Na data marcada, tudo se esclareceu. Já arrumada e usando o mesmo vestido branco com o qual foi apresentada à sociedade nos seus 15 anos, descobriu o que estava por trás da falsa liberalidade paterna: seu acompanhante seria tio Ambrósio, mais linha dura que o próprio pai.

        No clube, sentou-se ao redor de uma das mesas centrais, cortesia por causa da posição familiar, mas dali não conseguiu arredar pé. Qualquer jovem que se aproximasse com a intenção de convidá-la para dançar era peremptoriamente mantido à distância por tio Ambrósio, que, com um gesto de mão espalmada, nem deixava o cavalheiro chegar muito perto e dizia, carrancudo:

        - Poupe seus passos, meu jovem. Poupe seus passos.

        Ficou o baile inteiro, entre um gole e outro de guaraná caçula, só admirando as amigas deslizando, felizes, no salão.

Pouso manteiguinha

        Não era fácil a vida de comprador de ouro nos garimpos paraenses.

        Os locais eram de difícil acesso, e os riscos enormes. Para agilizar as compras e dar mais segurança no transporte, evitava-se ir de barco. A opção, então, era usar pequenos aviões monomotores, de manutenção improvável e pilotos cujo brevê era a prática diária.

        Naquele dia tinha pressa, como sempre, e aceitou ir em um teco-teco já lotado de mercadorias que seriam revendidas aos garimpeiros. Os bancos tinham sido retirados. O jeito foi se acomodar por cima das embalagens, deitado de frente para o bico do avião.

        Entre um gole de cerveja e uma baforada no bagulho, o voo seguia tranquilo até que avistaram a pista de pouso, ou coisa parecida. Era uma trilha que tinha sido aberta na floresta com enxadas e terçados, com um detalhe peculiar. Não era plana. Tinha uma pequena elevação na cabeceira.

        O piloto, dos mais afamados na região, avisou, confiante: “Vou fazer um pouso manteiguinha”.

        Em questão de minutos, após uma derrapagem no chão enlameado, o pequeno aparelho “asa dura” acertou em cheio um enorme cupinzeiro ao lado da pista improvisada e capotou. O mundo ficou de pernas para o ar.

        O passageiro, na posição em que vinha, foi arremessado através do para-brisa e caiu estatelado na vegetação. Por sorte, quebrou “apenas” um braço.

         O “pouso manteiguinha” foi um fracasso. Pelo menos, ninguém morreu.

O falso cego

        Diz o ditado que “malandro demais vira bicho”.

        Aqueles dois vagavam juntos em terras gaúchas já tinha dias. Tinham se encontrado por acaso, pois vinham de jornadas individuais. Eram andarilhos contumazes, com muitos anos de estrada.

        Naquela ocasião estavam aplicando o “golpe do cego”. Um deles fingia que não enxergava nada e, amparado pelo outro, abusava da caridade alheia, pedindo dinheiro ou alimento.

        Em determinada casa bateram à porta perto da hora do almoço. A proprietária, senhora de princípios cristãos e sempre disposta a fazer boas ações, se apiedou do “ceguinho” e de seu companheiro. Convidou-os a entrar para esperar a refeição, que estava quase pronta.

        Os malandros imediatamente acharam que iam se dar bem. Não contavam, porém, com a chegada do marido da inocente samaritana. Homem com muita experiência, era médico e logo desconfiou daquela dupla, principalmente do rapaz desprovido de visão.

        Puxou conversa, perguntando:

        - Então, o senhor é cego?

        - Sim, senhor, desde nascença.

        Como quem não quer nada foi chegando perto do rosto dele e movimentou o fura-bolo na direção do olho do golpista. Quando mais perto o dedo chegava, mais assustado o “cego” ficava. Antes que a farsa fosse descoberta, e com medo da unha afiada que vinha em sua direção, deu um grito e saiu em desabalada carreira, deixando o companheiro errante para trás. Este, sem alternativa, também fugiu desesperado.

        E nem almoçaram!

       

       

terça-feira, 29 de outubro de 2019

Cena Urbana




        Quase diariamente tenho saído para caminhar no calçadão que margeia a praia.

        Às vezes vou cedinho. Em outras ocasiões, nem tanto. Facilidade advinda do horário de trabalho flexível (home office).

      Quando faço meu exercício físico nas primeiras horas, entre 6 e 7 da manhã, me deparo com diversas pessoas, de ambos os sexos, dormindo nas calçadas.

     Algumas pernoitam sozinhos. Outras, aos pares. Todos enrolados precariamente em panos imundos e usando pedaços de papelão à guisa de colchão. Onde será que, durante o dia, guardam essas coisas?

        Hoje me deparei com cinco desses desafortunados no mesmo local, em frente à uma loja de roupas. Encostado num deles, um cachorro preto. O povo transitava indiferente, da mesma maneira que os sem tetos não estavam nem aí para a cidade que acordava. Meio que acostumados com a cena cotidiana. Ambas as partes, diga-se.

        Não sei se eles ficam ali todas às noites, mas acredito que sim. É como se fosse um ponto já reservado e respeitado entre os pares de infortúnio.

        Imaginei o que eu poderia fazer. Nada, somente me compadecer. E o poder público? Também não sei, nesta época de vacas magras e tanto egoísmo político, onde a solidariedade com os mais necessitados é exceção à regra constitucional de dignidade da pessoa humana (inciso III, art. 1º, Carta Magna).

        E isso sem contar com a lei divina de amor ao próximo. Sei que existe um tanto de gente que se dedica diuturnamente à caridade, a exemplo do que fazia, por exemplo, a recentemente canonizada Santa Dulce dos Pobres. Mas os problemas são tantos que o pouco que se faz não consegue diminuir significativamente essa chaga social.

        Não sou insensível, por isso sinto um pouco de dor quando vejo tal coisas. Mas tenho meus próprios problemas para resolver – financeiros, emocionais, familiares e outros mais. Teria que cuidar primeiro dos outros? Ainda não tenho tanto amor assim, se é que possuo algum. Que pena!

        Perdoai-me, Pai, e dai-me forças para “que eu procure mais consolar do que ser consolado; compreender do que ser compreendido e amar do que ser amado”. (Oração atribuída a São Francisco de Assis).    

terça-feira, 22 de outubro de 2019

Se isso...se aquilo...



        Diz o ditado que se arrependimento matasse, muita gente já teria morrido. Eu, inclusive.

        Diuturnamente se escuta alguém afirmar que se tivesse feito isso, a coisa teria sido diferente. Se tivesse feito aquilo, a situação estaria melhor. As pessoas querem justificar situações ou acontecimentos, geralmente os que não são bons, por opções equivocadas. Ledo engano.

        Não existe castigo. Nossas escolhas determinam as consequências. Ação e reação. Tese, antítese e síntese. A aparente desordem do Universo esconde, e mostra, a organização que permeia o que acontece. Tudo é nada. Nada é tudo.

        Milhares de anos atrás, Heráclito de Éfeso (540-470 a.C.) afirmava que "não se pode banhar-se duas vezes no mesmo rio porque nem as águas e nem você permanece o mesmo". O que aconteceu há um minuto já é passado. O que acontecerá no minuto seguinte é futuro. A realidade é o presente.

        Assim, o caminho que é trilhado deve ser muito bem preparado. Devagar se vai ao longe, ensina a sabedoria popular. E mais: toda longa caminhada começa com o primeiro passo, pensamento filosófico ora atribuído a Buda e ora dito ser de autoria de Lao Tsé.

        Mas isso (quem disse) é o menos importante. O interessante é a gente conseguir se conectar com esse caos/ordem para, através da expansão da nossa consciência, alcançar o verdadeiro, a meu ver, sentido da vida: paz.

    Por mais sem lógica que a natureza possa, às vezes, parecer é absolutamente impressionante como, a cada dia, se descobre a conexão que integra tudo quanto existe. O devir, esse fluxo permanente, movimento ininterrupto, atuante como uma determinação geral do universo, que dissolve, cria e modifica todas as realidades existentes, é prova maior da existência de uma força criadora e superior.

Lavoisier, há mais de 200 anos, exarou a sua famosa lei natural: “Na Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma".

        E o ser humano, parte integrante e principal dessa harmonia universal, apesar de tentar, pelo menos alguns, bagunçar com o coreto, está começando a chegar à conclusão de que ao contrário de procurar atrapalhar é imprescindível que dê curso à ordem natural das coisas, pois, mesmo que ainda não saiba ou sinta,o Universo, com certeza, está evoluindo como deveria” (Desiderata, Max Ehrman).

        Portanto, para não chegar ao fim da vida com o coração carregado de sentimentos atribuídos ao “se isto...se aquilo...”, ou até ver nos outros os entraves que foram enfrentados, sem soluções eventualmente alcançadas, é melhor encarar o mundo de frente, sabendo que “o dia de amanhã cuidará de si mesmo” (Sermão da Montanha).

Assim, em equilíbrio permanente, podemos ser um só no todo infinito.

       

       

       

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Barbeiragens



        Meu inesquecível pai, que Deus o tenha, tinha fama de barbeiro, não o profissional dos pentes e das tesouras, mas aquele motorista que costuma causar sustos no trânsito das ruas brasileiras. Aliás, segundo um primo meu, com o qual coaduno, neste particular, ele não só tinha a fama como era realmente um perigo ambulante.

        Conta-se que numa ocasião, salvo engano em Guaçuí, vinha ao volante de uma das Kombis que possuiu (era o carro predileto dele, para agasalhar a família de seis pessoas) e, ao soltar um espirro, acertou um carro estacionado. Desculpou-se, após definir o pagamento do prejuízo, dizendo que fechou os olhos enquanto expulsava o ar pelo nariz. Muitos anos antes de falecer deixou de dirigir e andava corajosamente de ônibus urbano.

        De uma maneira geral, porém, eu acho que existe muita gente desatenta com CNH em vigor. Para começar, tem uma turma exageradamente desrespeitosa, que não está nem aí para as regras de trânsito ou as mais comezinhas normas de convivência social, principalmente tendo nas mãos uma “arma” como um automóvel ou veículo maior.

        Furar sinal vermelho é quase uma rotina. Ultrapassagem em local proibido deixou, praticamente, de ser exceção para se tornar uma regra. Estacionamento em fila dupla está consagrado como “direito”. É impressionante.

        Quando morava em Porto Velho achava o trânsito de lá um tanto caótico, muito em função dos motoqueiros, que são milhares disputando espaço entre si. Difícil um cruzamento onde eles não se aglomeram querendo prioridade total para avançar. Mas isso porque eu ainda não tinha a experiência diária de dirigir em Guarapari.

        Porto Velho, sob este aspecto, ganha de dez a zero. De plano, as ruas lá são largas e retas e o traçado urbanístico permite que algumas vias tenham sentido único na direção do centro enquanto outras mantém o fluxo do trânsito em sentido contrário. A sincronia dos sinais é outra facilidade.

        Em Guarapari, até hoje não entendi de que maneira o gênio que definiu o fluxo do tráfego na cidade, se é que foi feito algum estudo neste sentido, chegou às suas conclusões. Por exemplo: as ruas são estreitas, e os carros estacionam dos dois lados. É só para complicar, permite-se mão dupla. Os motociclistas, ou melhor, motoqueiros, aqui avançam com a cara e a coragem na contramão, e quem quiser que saia da frente.

        Outra: placa de sinalização existe só para enfeite. Aquela seta que indica a direção é regularmente ignorada. Ao redor da feira de sábado todo mundo anda do jeito que quer, independentemente se a rua tem mão para esse ou para aquele lado. E mais: ciclista também apronta. Dias desses quase fui atropelado. Estava na faixa de pedestre e, ingenuamente, olhei apenas para o lado de onde vinham os carros. Em alta velocidade, um abusado numa bicicleta, inclusive carregando uma criança, passou com tudo na minha frente. Em pensamento, fiz aquele tradicional elogio à genitora do incauto.

        Porém, nem tudo é perfeito. Apesar de achar que tenho experiência e dirijo bem, mesmo assim não escapei. Arranhei a coluna da garagem do prédio onde moro. Não espalhem, porque é segredo.

        Como se diz, o sujo falando do mal lavado.

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Rapidinhas 2



Peixinhos do mar

        Na Rua 7 de Setembro, em Vitória, perambulava um homem chamado Américo Rosa. Ele dormia nas oficinas do extinto jornal O Diário.

        Nós – eu, meu pai, minha mãe e irmãos – morávamos na casa de número 407, próximo ao citado matutino.

        Aqui e acolá a gente via Américo Rosa com seu jeito maltrapilho e pedindo esmola. Repetia sem parar um refrão que dizia assim: “Os peixinhos do mar, vêm pra areia sambar”.

        Nunca tive problemas com ele, mas minha irmã caçula morria de medo de sair sozinha, porque a solitária figura folclórica daquele trecho ao pé do morro da Fonte Grande, sempre que a via se aproximava e pedia para segurar na mão dela. Ficava uns momentos, em silenciosa contemplação. Não era violento e nem fazia nada demais. E seguia cantando: “Os peixinhos do mar, vêm pra areia sambar”.

Poeminha

        Pequeno versinho recebido num sonho:

        Eu faço arte, eu sou tímido
       
        E nesse gagaga todo

        Esse caso nasceu através de um sorriso

Folclore

       Por falar em poesia, Guarapari também tinha (ou tem) as suas figuras peculiares. Aliás, me parece que todas as cidades possuem, né mesmo!?

     Não recordo o nome da pessoa (meu pai, que foi quem me passou essa informação, me disse, mas não estou lembrado), mas ele também cantarolava uma música própria. Andava pelas praias centrais entoando: “Guarapari tem um boi que sabe ler, balança o rabo, mas não sabe escrever”.

     Dizem que ficava ajudando os motoristas a estacionarem os carros. Fazia sinais com a mão garantindo: “Pode vir, pode vir”. De repente, num impacto inesperado, o veículo acertava algum obstáculo, seja uma árvore ou outro carro, e o indigitado “manobrista” saía correndo gritando: “Bateu, bateu!”

Se é verdade, não sei. Só estou vendendo o peixe do jeito que me passaram.



       

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Trostky




Acabei de assistir Trostky, série disponível na Netflix. São oito capítulos de uns 50 minutos, mais ou menos, cada um. Produção da televisão russa. Levei uns dez dias para ver tudo. Gosto desses seriados, mas não tenho tempo e nem disposição para ficar fazendo maratonas na frente da TV.

        Diga-se de passagem, se a gente não tomar cuidado acaba ficando meio viciado nesse tipo de programa, pois, em grande parte, são todos muito bem feitos, por profissionais competentes, roteiros elaborados e com atores de qualidade. Bom divertimento para pessoas notívagas, conforme é meu caso.

        Confesso que sabia pouca coisa sobre esse revolucionário de família judaica. No Google existem muitas informações falando do sucesso da série na Rússia, mas, também, ressaltando algumas inverdades históricas, como o inexistente encontro entre Trostky e Freud, isso mesmo, Sigmund, o austríaco considerado o pai da psicanálise. Mas encontram-se também teses garantindo a veracidade deste fato.

        Da minha perspectiva atual (62 anos de idade, com um passado, nos anos 80, de cinco anos de luta sindical permeada por ideologias de todas as matizes e, hoje, espírita) me coloco na posição de que nenhum extremismo (esquerda, direita ou o rótulo que tiver) é bom ou pode ser útil para atender às necessidades de um povo. Governo, seja municipal, estadual ou federal, independentemente do nome, que faz aquilo o que a população necessita, é o melhor.

        Mas na época (1917 e anos seguintes) e naquela situação imagino que não havia muito o que se fazer de diferente. Historicamente, a meu ver, toda revolução tem seus momentos de terror. Na extinta URSS durou bastante tempo. Se Trostky tivesse vencido a luta interna do Partido Comunista com Stalin, após a morte de Lenin, as coisas seriam diferentes? Não se sabe. Me pareceu que o roteiro do seriado quis passar esta ideia, mas tudo são especulações.

        Porém, enquanto, digamos, show, gostei para caramba. Sou aficionado por História (quem sabe ainda faço um mestrado na área), pois entendo que serve para entendermos o presente e projetar o futuro. E esses personagens são fascinantes. Mostram facetas comuns a todos os homens e mulheres e, além disso, demonstram um lado de coragem e de superação. Lutam com unhas e dentes por tudo aquilo em que acreditam.

        E isso também se vê presente na pessoa comum. O mundo está cheio de gente (pode até ser um vizinho) que enfrentou dificuldades e deu a volta por cima, construiu uma vida e uma família. Não é famoso. Não liderou uma revolução. Não apareceu na mídia. Mas é respeitado. Não deve e não teme. Morre tranquilo, sabendo que deu o melhor de si para viver em paz com todos.

Esses são os verdadeiros heróis.








segunda-feira, 7 de outubro de 2019

O globo terrestre




Me dei de presente um pequeno globo terrestre, de cinco centímetros de diâmetro.

Eu possuo grande atração pelas ciências humanas, com especialidade geografia e história. Comprei um Atlas apenas para ficar folheando e ver os mapas dos países e dos continentes. Tenho por predileção ler biografias.

Até hoje sinto vontade de fazer um mestrado nessa área, mas a coragem ainda não chegou.

Nesses tempos em que os terraplanistas estão divulgando amplamente as suas teses (as redes sociais aceitam tudo), e que, segundo pesquisas, mais de 10 milhões de brasileiros acreditam nesta hipótese, a esfericidade da Terra é questionada sem que, a meu ver, os argumentos apresentados afastem a sua veracidade.

Deixo esse debate para os especialistas. Quero me ater, tão somente, a falar um pouco do tamanho e da diversidade desse mundão de meu Deus.

Olhando o pequeno globo em cima da mesa é possível ter uma noção dessa dimensão. Existem lugares que ainda não tinha nem ouvido falar, como a Ilha Gough, que pertence ao Reino Unido e fica próxima às Ilhas Falkland (ou Malvinas), no Oceano Atlântico. O que os súditos da rainha Elizabeth II querem com esse pedaço de terra tão distante de casa?

Outra: no Oceano Índico situa-se a Ilha Kerguelen, que faz parte da França. Mais abaixo encontra-se a Ilha Mc Donald, que está sob o domínio da Austrália. Já no Oceano Pacífico, os Estados Unidos detêm o controle das Marianas do Norte. No Caribe, entre outras, localizam-se as Ilhas Virgens Britânicas e as Ilhas Virgens Americanas. Imagino que há mais, pois nem todas devem estar relacionadas na minha minúscula esfera.

Enfim, aponta-se a existência entre 193 a 206 países soberanos, dependendo de quem faz a conta, se a Organização das Nações Unidas ou o Comitê Olímpico Internacional, por exemplo. Uma vida toda talvez não seja possível para conhecer fisicamente esses lugares.

São milhares de praias, montanhas, vales, rios e florestas cada uma mais bonita que a outra. Incontáveis animais, pássaros, insetos e répteis. E, também, costumes e manifestações artísticas inimagináveis para quem está distante.

Povos que podem ter, entre si, semelhanças culturais, físicas, ideológicas e religiosas, mas que denotam, também, traços sociais próprios. Em alguns casos, opta-se por salientar as diferenças, advindo daí, a meu ver, os confrontos políticos.

Vi com bons olhos, à distância e apenas com a compreensão de uma pessoa comum, a União Europeia, hoje combatida pela Inglaterra. Tenho a compreensão de que as pessoas, sem as quais não existiriam territórios nacionais, devem se unir pela igualdade. Sonhar com um mundo sem fronteiras ainda é um tanto utópico, mas nada nos impede de pensar dessa maneira. Imagino que nos primórdios da humanidade era assim.

Acredito que o salto tecnológico que vivemos, trazendo inúmeras facilidades ao cotidiano humano, tende a nos aproximar, eliminando diferenças de idiomas e derrubando fronteiras. Afinal, “pátria”, com todo o seu apelo emocional, pode ser substituída por “irmãos” e “irmãs”, independentemente de raça, credo ou cor.

Todos somos gerados e nascemos da mesma maneira. Tanto faz ser europeu, americano, asiático ou africano que vivemos e morremos de forma semelhante, seja rico ou pobre. Sentimos as mesmas coisas, com reações físicas de fome, frio ou calor, emoções de tristeza ou alegria idênticas.

Por quê, então, o mundo não pode ser um só, sem divisões territoriais? Somos hoje cerca de 7,7 bilhões de habitantes (dados estimados para abril/2019). A ONU prevê que seremos 11,2 bilhões em 2100. É muita gente, com tendência de crescimento. Haverá espaço para todos?

Sim, mas somente se a paz for instalada, porque, em caso contrário, nesse formigueiro de gente, quem vai querer sair de casa para ficar esbarrando com as pessoas na rua? Daí a minha crença que quanto mais o tempo passa, mais caminhamos para a igualdade, apesar de aparências em sentido contrário.

Quem viver, verá!



terça-feira, 1 de outubro de 2019

Saber viver



Viver é melhor do que sonhar, já cantava Belchior.

Viver é bom, mas saber viver é melhor ainda, entoam pensadores diversos, em épocas e locais diferentes.

Aprender a viver, porém, é que são elas.

Ninguém nasce sabendo, pois se assim o fosse o mundo seria o paraíso perdido relatado nos textos bíblicos.

Uma minoria, bem mínima mesmo, mesmo na flor da juventude, consegue alcançar esse conhecimento essencial às relações humanas.

Outros mais, infelizmente, demoram dezenas de anos para chegar à conclusão de que a paz é o maior tesouro que um ser humano pode almejar.

A maioria, porém, permanece batendo cabeça até morrer, sem se preocupar um mínimo que seja em facilitar as coisas, para si mesmo e para os outros.

Gente que se acha dona da verdade. Gente que adota a filosofia do primeiro eu, segundo eu, terceiro eu. Gente que pensa que pode falar o que quiser, do jeito que quiser, na hora que quiser, porque é “sincera e positiva”. Quanta ignorância.

Lamentável observar alguns que vivem meio século ou mais e ainda não entendem que uma palavra pode machucar mais do que um soco, por exemplo. Por quê, meu Deus, somos tão inteligentes para construir e inventar e falhamos tanto em compreender quem está do nosso lado?

Todos os problemas mundiais estarão solucionados a partir do dia em que a humanidade se reconhecer como uma só, independentemente de raça, cor ou credo. Para isso, entretanto, cada um tem que fazer a sua parte, pois não existem líderes messiânicos que vão resolver os problemas de todos.

Eu preciso procurar o jeito certo de falar com as pessoas de minha casa, com meus vizinhos, com os moradores da rua, da mesma maneira que eles também têm que entrar nesta sintonia harmônica. Mesmo o silêncio ou uma expressão facial pode dizer muita coisa, para o mal e para o bem. Assim, cada um cuidando de si, chegaremos a um denominador comum em benefício geral. A partir do micro, construindo o macro.

Citando novamente Como nossos pais: “Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”. Gerações e gerações repetindo erros e agindo inconsequentemente. Até quando!

Mas o cantor e compositor cearense, na mesma composição, ilumina o futuro com a esperança de que saibamos que “para abraçar seu irmão e beijar sua menina na rua é que se fez o seu braço, o seu lábio e a sua voz”.

Vivamos, mas sem deixar de sonhar.