segunda-feira, 26 de abril de 2021

Voltou

 


         Foram sete dias. Uma semana inteirinha. De manhã, de tarde e de noite sentindo a ausência. E não havia nada que eu pudesse fazer. Aquela presença rotineira, do encontro a qualquer hora, sabendo que quando precisasse estaria à disposição se tornou uma distância que gerava a expectativa da volta. Quando seria?

 

         É duro você acordar e olhar ao redor no quarto e notar que está faltando algo. Ao abrir os olhos cedinho a visão já tem na memória tudo o que sempre esteve ali, e uma diferença, por menor que seja, dá a impressão de se estar num lugar estranho, como um sonho incompreensível. Terei sido teletransportado durante o repouso noturno?

 

         Porém, não há mal que sempre dure, dizem os antigos guardiães da perene sabedoria popular. Domingo à noite, enquanto esperava a hora de me deitar, um telefonema surpresa trouxe-me a notícia alvissareira: o diagnóstico e conserto do meu notebook tinham sido concluídos com sucesso, e o equipamento me seria entregue imediatamente.

 

         Deixei a sonolência de lado, liguei as lâmpadas da sala e aguardei, sentado no sofá, até que meu genro, especialista em TI, entrasse no apartamento carregando a bendita máquina que tinha deixado um vácuo diuturno que não estava conseguindo sanar nem maratonando séries e mais séries nos serviços de streaming.

 

         A tecnologia que nos cerca atualmente de tal maneira está inserida na nossa vida que que não se pode mais prescindir dela. Como atualizar meu blog sem o computador para escrever o texto e a net para postar? Claro, poderia até usar o celular, mas aquela tela de menor tamanho e o teclado reduzido não servem para mim.

 

         Nas redações onde trabalhei, em priscas eras, gostava das máquinas de escrever com teclas grandes, que facilitavam datilografar com rapidez, conforme é meu costume. Por isso, alegrei-me tanto com o retorno desse aliado cibernético, com um HD, ou disco rígido, novo (mesmo com capacidade de armazenagem inferior) e ainda precisando trocar a bateria.

 

         Mas, agora, pelo menos posso voltar a dialogar com o mundo, brincar de escrever e até trabalhar, pois em tempos pandêmicos o tal do home office é que garante ainda o dinheiro nem tão suado no final do mês.

 

         Seja bem-vindo e longa vida, caro colega.

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Plágio

 

         Minha fraterna amiga Cristina Moura, professora, jornalista e escritora, tudo de mão cheia, brindou seus milhares de leitores com mais uma pérola, no texto intitulado Belezuras e caracóis, disponível em https://wp.me/p9Zmzf-2cny.

         Na crônica, com a leveza, perfeição linguística e fluência verbal que são marcas registradas da sua enorme capacidade, a sensível paraibana descreve seu encontro inicial com as primeiras letras, quando, talvez entusiasmada por desvendar tantos mistérios, buscava aquela caligrafia de pergaminhos medievais.

         Hoje em dia, nesse mundo cada vez mais cibernético e digital, a arte de escrever está circunscrita ao teclado de um computador, por ela definido como “representante da evolução tecnológica da palavra escrita”. É verdade. Papel e caneta estão tendo uso reduzido, e talvez se tornem obsoletos em alguns anos. Quem viver, verá.

         Aproveitando a ideia original da minha irmã de lides profissionais e caminhada espiritual, lembrei também do meu período de foca, lá no início dos anos 70, no tempo ainda das linotipos. Inexperiente, queria registrar no meu bloco de anotações tudo o que o entrevistado dizia, e fazia uns garranchos e abreviações. Ao chegar à redação, tinha dificuldade para entender o que havia escrito. Com o tempo, percebi que bastava anotar pontos essenciais, e o restante vinha na memória.

         Meu saudoso pai, Renato José Costa Pacheco, já no final da vida, comprou e instalou em seu escritório um PC e uma impressora. Mesmo assim, continuou escrevendo seus livros à mão, em folhas de papel almaço. Cabia à minha filha do meio, Taís, fazer a posterior digitação. Velhos hábitos são difíceis de mudar.

         Já minha neta Alice não tem dificuldade nenhuma em usar um note, celular ou qualquer outro aparelho eletrônico. As gerações se sucedem e as novidades são assimiladas ao ponto de se tornarem coisas rotineiras, até que sobrevenha alguma outra invenção que mude os conceitos e práticas novamente. Faz parte da vida, acredito.

         E plagiando a nobre profissional acima referida, encerro: “Teclado, você é todo culpado, mas grata por existir”.

         Vamos em frente, pois.

quarta-feira, 14 de abril de 2021

Falhou...

 


         Pois é. Não deu para quem quis.

 

         Menos de meia depois que foi aberto o agendamento para vacinação contra a COVID-19 na faixa etária de 60 a 64 anos as mil vagas, ou doses, existentes foram todas ocupadas. Fiquei a ver navios.

 

         Anuncia-se que brevemente novos lotes chegarão, e aqueles que não foram atendidos nessa primeira vez serão, então, contemplados. Deus permita. Já estava até imaginando se iria fazer um vídeo ou somente uma fotografia quando o imunizante fosse suavemente inoculado no meu braço (esquerdo ou direito, eis a questão?).

 

         Enfim, o jeito agora é esperar. É incrível como o jogo político de transferência de responsabilidades afeta tão diretamente a vida do cidadão comum, ainda mais em momentos emergenciais. No ano passado, alguém disse que iria comprar vacinas “se houvesse demanda”, como se toda a população fosse negacionista.

 

         Nem mais essa parcela do povo brasileiro, diminuindo com a velocidade de um avião a jato, está tão crédula assim de que o coronavírus seja tão somente “uma gripezinha”, pois cada vez que morre um parente, um amigo ou mesmo mero conhecido fica mais difícil evitar aquela sensação de que o bicho pode pegar, daí que, na dúvida cruel, é melhor correr para o posto de saúde mais próximo e tomar a vacina, seja ela chinesa, inglesa ou brasileira.

 

         As estruturas ferruginosas das instituições nacionais precisam, urgentemente, de um banho de vinagre e do uso de lixa ferro na granulação 20, no mínimo, para que a craca acumulada ao longo de anos, ou talvez séculos, possa ser, finalmente, removida de uma vez por todas. É trabalho árduo, provavelmente incapaz de ser realizado pela minha geração.

 

         Brincam presidente, próceres jurídicos, senadores e deputados com a propalada, e nem sempre comprovada, cordialidade do cidadão desse país tropical. A tal da CPI da Pandemia nem bem foi instalada e já virou motivo de piada. A discussão atual é se ela pode ser virtual ou somente deve funcionar presencialmente. Quer dizer: estão de sacanagem. Vai acabar em pizza, mais uma vez.

 

         Porém, como eu não tenho nada com isso, me limito a fazer esse desabafo. Melhor aproveitar o tempo com coisas mais aprazíveis, tipo apreciar a incrível serenidade do mar nessas manhãs amenas de outono. Com a maré baixa, quase não se vê ondas e a água esverdeada toma a forma de um sereno lago andino a convidar para um mergulho renovador.

 

         Mas quando a vacina chega mesmo? Estou na fila.

quinta-feira, 8 de abril de 2021

Tá chegando a hora

 

           Parece que minha hora está chegando. Não, calma, sem sustos. Estou falando do momento em que vou ser vacinado contra o novo coronavírus. É.....em breve será a vez da faixa etária do pessoal com mais de 60 e até 64 anos de idade receber a tão esperada vacina.

 

         Minha digníssima patroa, conforme se dizia outrora (parênteses: quem fala assim revela DNA – Data de Nascimento Antiga), foi imunizada uns dois dias atrás (ela tem mais de 65 anos), com uma dose de um lote da AstraZeneca. A segunda etapa será em junho.

 

         Confesso que estou na maior expectativa de, finalmente, poder ter uma esperança pessoal renovada em relação ao controle dessa pandemia. Que eu saiba, ninguém que foi vacinado, no Brasil e no mundo, virou jacaré. Pelo menos, até aqui. Tudo bem, por essas bandas tem muita lagoa.

 

         Brincadeiras à parte, espero que um mínimo de consciência esteja cobrindo nossos abnegados governantes, que deixem de lado diferenças pessoais e políticas e invistam seriamente na compra e produção de imunizantes para que a tão propalada imunidade do rebanho seja alcançada o mais rapidamente possível.

 

         Vivemos um dilema atroz: restrições de mobilidade social causam desemprego, fome e abalos econômicos. Nenhum controle ou deficiência nas regras sanitárias de isolamento social mostram o outro lado também perverso dessa mesma moeda: aumento dos casos, hospitais lotados e mortes em descontrole. Tristes trópicos, poderia dizer o antropólogo e filósofo francês Claude Lévi-Strauss.

 

         Os argumentos em favor de uma ou de outra medida são muitos, cada vez mais acirrados. O pobre noticiário midiático, com enfoque limitado à tragédia e aos caos, revela brigas entre pessoas por causa do uso (ou não uso) de máscara. Festas clandestinas são interrompidas às dezenas. No nosso povo, tão criativo, tem aqueles (claro, não poderia faltar) que vendem soro fisiológico como se fosse vacina até em porta de supermercado. A 400/600 reais a aplicação. E há quem compre. Sem contar os casos de fura-filas.

 

         Seria cômico se não fosse trágico. Mas essa é a dialética existencial da vida e da morte. Nessas horas, aflora o instinto animal da sobrevivência e os egoístas, que não sabem o que é vida em coletividade e são adeptos do “farinha pouca, meu pirão primeiro”, se lançam vorazes a campo para garantir seu suposto direito prioritário em relação aos demais habitantes dessa Pindorama, que vive dias de desvarios, onde a luz que se avista ao final do túnel não se sabe se é a saída ou o trem que está vindo.

 

Fico com a primeira hipótese.


sábado, 3 de abril de 2021

São todas essas coisas...

 


         Madrugada insone (mais uma) e a procura do que fazer entre o quarto e a sala em busca de inspiração.

 

         A geladeira não oferece muitas alternativas alimentares, além de pedaços de frango sobrados do almoço. Pão com queijo, melhor guardar para o café da manhã. Um pacote pequeno de batatas fritas parece ser a mais adequada e menos trabalhosa opção, considerando o adiantado da hora.

 

         Na TV, Wesley Snipes distribui tiros e socos à vontade no filme O Detonador. Termina fugindo com a mocinha/bandida (interpretada pela atriz italiana Silvia Colloca) e 30 milhões de dólares. Nada mau. “O Negão é bom”, afirma, entre uma cochilada e outra, minha mulher, que, nessas ocasiões notívagas, geralmente assiste o início e o final da película, o que, não raras vezes, é suficiente para se entender o roteiro. Hollywood não é mais o mesmo.

 

         Da janela é possível avistar a quase fria claridade matutina outonal se avizinhando no horizonte. Sono encostando nos lombos e a cama convidando para o repouso. Dormi.

 

         Pouco mais de duas horas depois, já com os raios solares invadindo o ambiente (preciso me lembrar de usar as cortinas), eis me novamente fazendo o que repito rotineira e incansavelmente, em primeiro lugar, todas as vezes em que acordo: abri os olhos.

 

         Calmamente, como se não devesse nada nem a Deus e nem ao mundo, espreguicei e sentei-me na beirada do colchão (dizem que é bom fazer isso: não se levantar de uma vez). Finalmente, após uns minutos de reflexão, coloquei os pés no chão. Fiz minhas orações e retomei o impasse filosófico da noite anterior daquele silogismo de premissa única (se é que existe) e ainda necessitando de uma conclusão: o que fazer?

 

         Ver os sites noticiosos? Nem pensar. Já deu o que tinha que dar tanta (des)informação sobre o novo (nem tão novo assim, atualmente) coronavírus. Aliás, diga-se de passagem, parece que ainda nesse mês de abril chegará a vez da minha faixa etária ser vacinada contra a COVID. Sem medo de virar jacaré, vou oferecer o braço à imunizadora que estiver de plantão no momento e guardarei o cartão para mostrar aos meus netos(as): crianças, sou um sobrevivente.

 

         O mar, indiferente a toda essa problemática existencial, mantém o ritmo de sempre, indo e vindo vindo e indo, umedecendo a areia da praia com a espuma rendada e branca das ondas. Quem sabe uma caminhada no calçadão possa clarear minhas ideias!? Mas o dever me chama: comprar pão, determina o poder superior mundano do reino que chamo de lar. Como dizem os antigos: manda quem pode, obedece quem tem juízo.

 

         Ai, ai. É tempo de murici, cada um cuide de si, diria o Coronel Tamarindo, personagem euclidiano de Os Sertões.