A pobre senhora não sabia como tinha se metido
naquela enrascada.
Havia ficado viúva, com um filho
pequeno para criar. Seu falecido marido deixou de herança a casa simples em que
moravam e um comércio modesto, instalado na parte da frente do terreno.
Meio sem saber como, colocou para
dentro de sua morada um homem que apareceu por ali com uma conversa mole de
cuidar dela, do negócio e da criança. Com pouco tempo já estava arrependida. É
certo que ele ampliou a mercearia, mas teve a infeliz ideia de funcionar, à
noite, um bar, que começou a reunir o que de pior havia na redondeza.
Além disso, o indigitado comerciante
passou não só a vender bebida alcoólica como também a consumir exageradas
doses, de terça a domingo (segunda-feira não funcionava). E ela e o filho eram
vítimas do “machão”, que chegava em casa embriagado e agredia os dois,
principalmente a mulher. Depois, caía naquele torpor típico da bebedeira.
A situação se arrastava por anos, sem solução
à vista. Porém, surgiu a necessidade urgente de encontrar um jeito de escapar
do problema, pois o menino, que sempre fora obediente e estudioso, passou a não
querer ir mais para a escola, ficava pelos cantos e passava a maior parte do
tempo trancado dentro do quarto. Não abria nem a janela.
Exames clínicos não mostravam nada, a
não ser uma progressiva anemia, pois o já rapazola nem se alimentava direito
mais. Foi diagnosticado com depressão, de causa desconhecida. Buscando alternativas,
a mãe desamparada pedia auxílio a um, opinião de outro e até que chegou aos
seus ouvidos a informação de que ali mesmo na cidade, num bairro próximo,
morava uma pessoa que entendia dessas coisas sem explicações.
Foi lá. O homem era dirigente de um centro de
orações, que funcionava em frente de sua residência. Ouviu o relato e falou
para ela levar o rapaz num determinado dia que ele iria ver o que era possível
fazer. Na data e hora marcadas quem surgiu com o enteado foi o padrasto. Tinha
resolvido ele mesmo ir ver aquele trabalho.
Arrogante, reclamou logo da cadeira
que lhe foi oferecida, mas não aceitou trocá-la por outra. O rapaz, calado e de
cabeça baixa, sentou-se ao lado. Auxiliado por mais duas ou três pessoas que
tinha convidado, o líder espiritual formou um círculo e começou a se
concentrar. Chamou pelos espíritos superiores e pediu que mostrassem uma
solução para o caso. Uma energia poderosa circulou no ambiente.
Clamou por entidades espirituais. Orou,
entoou cânticos misteriosos e seu poder mental trouxe à tona a raiva existente
no interior daquele ser embrutecido, que pulou no meio do salão e disse que
iria quebrar tudo, a começar pela cadeira onde estava sentado. Com um golpe,
atirou-a no chão. Rapidamente, o dirigente dos trabalhos colocou a mão na
cabeça do raivoso e ordenou que ele se acalmasse. Igual a um touro amarrado no
mourão, aceitou a nova cadeira que lhe foi oferecida e ficou o restante da
sessão quieto, mas bufando à semelhança de um animal. Foi corrigido, com
palavras inspiradas vindas do além, como se fosse um filho sendo repreendido severamente
pelo pai. Saiu dali manso como um cordeiro.
Dias depois, a mãe do rapaz voltou e
relatou o desfecho da situação. O homem chegou em casa calado, ficou dois dias
deitado na rede. Não abriu o comércio. Não bebeu. Não falava, pouco se
alimentou. No terceiro dia, sem nenhuma explicação, juntou umas poucas coisas pessoais
e foi embora, nunca mais sendo visto.
O adolescente ficou bom. Recuperou a
vontade de viver, de estudar e de comer. O problema era o padrasto opressor e
violento. Quando ele sumiu, tudo se ajeitou novamente. A vergonha tamanha de se
ver como realmente era por dentro deixou-lhe como única alternativa desaparecer,
sem deixar rastros, em busca de onde não fosse conhecido para poder recomeçar.
Às vezes, quando a gente menos espera, uma
porta se abre e a força divina nos ampara de forma inusitada. E o que Deus
abre, ninguém fecha. Por isso que os momentos difíceis, as provações, são
apenas o prenúncio de dias melhores.
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