quarta-feira, 20 de abril de 2011

A experiência sindical




Eu também já agitei as massas, se me permitem usar esta força de expressão.
Aconteceu quando fui diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Espírito Santo, no período de 82 a 85, sendo presidente Tinoco dos Anjos. Anteriormente, fui dirigente sindical na redação da TV Gazeta.
Vivíamos a sequência daqueles acontecimentos que acabariam redundando na redemocratização. Era a campanha da anistia, ampla, geral e irrestrita. As diretas já (presidente). Eleições diretas para governador. Toda aquela gama de reivindicações reprimidas por muito anos vinha à tona. E, obviamente, na classe trabalhadora a repercussão era muito mais intensa.
O SINJOR estava na sua segunda administração. O primeiro presidente foi Rogério Medeiros, velho guru de nossa geração. A entidade funcionava numa sala na Escadaria Maria Ortiz, parte central da cidade. A grande novidade, tanto para empregados quanto para patrões, era a questão salarial. Na administração anterior foi conquistado o piso de cinco salários mínimos. Agora, era necessário ampliar e manter os benefícios.
Ninguém estava acostumado a negociar, pois no período da ditadura militar tudo era imposto de cima para baixo. Além disso, a diretoria do sindicato era composta por profissionais de diversas correntes políticas, muitas das quais tinham recentemente saído da clandestinidade (as mais radicais). Administrar todos esses interesses não era brincadeira. Mas Tinoco parecia um político de Minas Gerais (nasceu perto de lá, em Barra do São Francisco/ES) e tinha jeito e paciência para manter a unidade, tanto internamente, nas nossas reuniões, quanto externamente.  
As negociações, entretanto, na época da campanha salarial (acho que foi em abril), com as principais empresas de comunicação eram penosas e tudo indicava que seria encaminhada uma proposta de greve. Confirmado o impasse, foi convocada uma assembléia geral a se realizar no auditório da Secretaria da Agricultura, no Forte de São João. Nunca vi tanto jornalista reunido. Cabe ressaltar que fizemos um trabalho de formiguinha, procurando e falando com o máximo possível de pessoas para garantir a representatividade do movimento, pois, como já foi sabiamente dito por alguém, não há greve sem grevistas. E a paralisação das atividades foi aprovada por ampla maioria (era a coisa mais linda aquele mar de braços levantados).
Não estou lembrando, no momento, quantos dias durou o movimento (é engraçado chamar de movimento uma atividade onde todos ficam parados), mas alguns episódios foram marcantes.
Na Rede Gazeta, por exemplo, chegamos antes de o sol nascer e conseguimos impedir que fosse ao ar o noticioso Bom Dia Espírito Santo, que começava de manhã cedo. O jornal impresso, salvo engano, circulou, mas não com sua edição completa.
Em A Tribuna, porém, é que o bicho pegou. O preposto do patrão não aceitava negociar e como naquele matutino a categoria estava mais politizada, a radicalização mútua foi o mote da campanha. Em frente à entrada principal, por exemplo fizemos um piquete (foto acima) e não deixamos ninguém entrar. Me lembro que um rapaz queria entregar uns documentos para o diretor e foi barrado. O dito cujo saiu de seu gabinete e exigiu a entrada do funcionário, o que recusamos. Ele, então, pegou o braço do empregado e quis puxá-lo, na marra, para dentro e romper o nosso cordão, exatamente no local onde estávamos eu e a companheira Annie Cicatelli. A francesa firmou o pé, eu senti que também não podia amiudar e empurramos o cidadão de volta para a rua.
Alguns fura-greves quiseram fazer o jornal, e conseguiram imprimir umas quatro páginas. Quando as kombis da distribuição saíram de madrugada das oficinas, tiveram os pneus furados pelos pedaços de pau com pregos virados para cima que espalhamos na rua. Comentários dos motoristas: "Não adianta, eles são guerrilheiros". Infelizmente, não houve acordo e os donos da empresa resolveram, simplesmente, fechar o jornal, que só foi reaberto anos depois.
Por causa da greve e de meu posicionamento um tanto rude com os chefes, fui "encostado" na TV Gazeta, onde trabalhava. Não podia ser demitido porque era diretor do sindicato e, nessa condição, a legislação garantia a chamada imunidade sindical. Praticamente não fazia nada. Só puderam me tirar uma gratificação de chefia que eu tinha. Isso foi até objeto de uma ação trabalhista, para definir se "editor" é uma função inerente à categoria jornalística ou um cargo de confiança que a empresa pode dispor como quiser. Ganhei na primeira instância, numa das Juntas (hoje, Vara) do Trabalho de Vitória e perdi na segunda, no Tribunal Regional do Trabalho, cuja sede, na época, era no Rio de Janeiro.
Bom, entre tudo isso, chegou a época da eleição da nova diretoria do SINJOR. Nosso grupo precisava escolher um candidato a presidente. Tinoco não queria concorrer à reeleição. Rogério Medeiros estava apoiando a chapa contrária. As pessoas convidadas recusaram a disputa. Aí, eu fui, por assim dizer, a última opção. Aceitei concorrer, mas não tinha mais o mesmo pique de antes. Estava um pouco desiludido com a militância, com as incompreensões, com todo mundo achando que estava certo e os outros completamente errados. Fui para o pleito não me importando muito com o resultado. No primeiro turno, o candidato concorrente (Sérgio Egito) não obteve o número de votos necessários, mas no segundo não teve jeito: ele ganhou.
Apesar do fim do mandato, ainda tinha mais um ano de carência, por assim dizer, na tal da imunidade sindical. Mas queria sair, do emprego e da cidade. Procurei Tinoco dos Anjos e pedi que ele me acompanhasse numa reunião com o presidente da Rede Gazeta, Carlos Fernando Monteiro Lindemberg Filho (meus respeitos, Cariê) e propus um acordo: eu abria mão da imunidade, ele liberava meu FGTS e estava tudo certo.
E assim aconteceu. Pouco tempo depois, arrumei as malas e vim para Rondônia. Mas isso fica para outro dia.


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PS: Mudei a configuração do blog e agora a postagem de comentário está liberada mesmo para quem não tem conta no Google, ok?

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