domingo, 4 de outubro de 2020

Cadê a minha máscara?

 


          Até uns dias desses era comum as pessoas perguntarem coisas do tipo:

 

          - Onde estão as chaves do carro?

 

          - Alguém viu meus óculos?

 

          - Quem pegou meu celular?

 

          Com o advento da pandemia e, mais recentemente, a retomada gradual da liberdade de movimentação, uma nova indagação passou a fazer parte do cotidiano de homens e mulheres, pelo menos daqueles que querem colaborar no esforço coletivo de controle do novo coronavírus. A questão incorporada ao dia a dia é:

 

          - Cadê a minha máscara?

 

          Ou por outra: minhas máscaras. Afinal, se for para seguir à risca o protocolo sanitário (troca após duas horas de uso, lavar quando chegar em casa) cada cidadão(ã) precisa no mínimo de duas, mas o ideal, conforme descobri na prática, são três.

 

          Inicialmente, comprei duas, uma verde e outra azul. Depois, ganhei uma camisa de minhas filhas, e veio de brinde uma máscara de cor preta. Assim, fiquei usando-as até que, inexplicavelmente, a máscara verde sumiu, e pouco dias depois a azul também desapareceu, ambas como se tivessem vida própria. Improvisadamente, comprei outra numa banca de revistas, até que, por acaso, localizei a máscara azul no bolso de um casaco.

 

          Tenho um amigo que só tem uma, que deixa dentro do carro. Faz uns seis meses que a máscara está lá. Não raras vezes ele vai ao supermercado ou a uma padaria e tenta entrar sem o, digamos, equipamento de segurança, mas é barrado. Então, volta no veículo para buscar a dita máscara, que nunca foi lavada. Pertence à turma negacionista, com todo direito a ter essa e outras opiniões sem fundamentação.

 

          Máscara no queixo também tem sido uma das preferências nacionais. Avistei numa farmácia um senhor que aparentava beirar os 80 anos de idade que tinha adotado a seguinte indumentária: máscara no queixo, viseira de plástico levantada na altura da testa e capa de chuva, como se fosse uma paramentação médica, aberta e esvoaçante. Resumindo: não estava se protegendo coisíssima nenhuma.

 

          Confesso, entretanto, que esse negócio de andar camuflado já está dando gastura. São muitos os memes sobre o tema, pois num passado recente mascarado ou era bandido ou estava indo para um baile de Carnaval – exceção às máscaras profissionais de médicos, dentistas, soldadores, esportistas e outros mais.

         

Etimologicamente discute-se até hoje a origem do vocábulo. Alguns acreditam que poderia ser proveniente do latim (mascus ou masca; "fantasma") derivado do árabe (maskharah, palhaço; e do verbo sakhira, "ao ridículo"). Mas ela também poderia ser proveniente do hebreu (masecha), cuja tradução seria algo como "ele zombou, ridicularizou" (obviousmag.org/anna_anjos/2013/11/a-origem-da-mascara.html).

 

Jesus, em sua infinita sabedoria, diz que não se deve julgar pelas aparências. Estuda-se atualmente, se as feições do rosto humano podem dizer alguma coisa do caráter de uma pessoa. Existem até uma técnica denominada Fisiognomonia dedicada ao tema. Na prática, ensina a pesquisadora Valquíria Martinez, que lançou recentemente o livro Os mistérios do rosto (Ed. Madras, 168 páginas), a leitura é feita a partir da associação entre formas geométricas dos elementos da face e características de personalidade. Por exemplo: maçãs do rosto e maxilares salientes denunciam pessoas ciumentas, assim como olhos e queixos mais arredondados apontam para alguém maternal, dócil. Com o avançar da idade, os traços hereditários perdem importância diante das linhas de expressão e outros sinais adquiridos.

         

Se antes muita gente falava uma coisa e pensava em outra, avalia com a oportunidade de se esconder dizendo que está evitando ser diagnosticado com a COVID-19. Para alguns, funciona como um duplo esconderijo: uma máscara sobre a outra.

 

Bom, o que eu sei é o seguinte: a meu ver, quanto mais cedo as máscaras caírem será melhor para todos – e isso tanto no sentido popular (fulano deixou cair a máscara, ou seja, botou as manguinhas de fora), quanto no aspecto técnico que pode significar o fim da pandemia. Utopia, dirão, principalmente no que diz respeito ao primeiro item, mas o que seria de nós sem sonhar?

 

E enquanto o José Simão procura o colírio alucinógeno dele, eu vou atrás de encontrar a minha máscara (a de pano, bem entendido).

 

- Cadê a minha máscara?

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