Naquele beiradão
amazônico as regras ditas civilizadas nem sempre eram respeitadas, ou mesmo
consideradas como corretas ou necessárias.
Tinha apenas 16
anos, sonhava estudar e ser professora, mas o pai tinha outros planos. Para
atender a um amigo, já com 35 anos de idade, que morava em outra cidade maior,
próxima da sua, deu – e o termo é esse mesmo, foi dada de presente – a filha adolescente
para que o solteirão fosse viver com ela.
Sem alternativa,
seguiu viagem com o homem que seria seu “marido”. Pouco tempo depois,
engravidou. Ainda menor de idade, trocou os bancos escolares pela lida
doméstica e pela responsabilidade de ser mãe, quando ainda precisava da sua
para lhe acalentar.
Dois anos após, ficou
grávida novamente – desta vez, uma menina. A vida virou uma rotina que só não
se tornou um suplício porque o homem a quem fora entregue como prova de amizade e
consideração era uma pessoa boa, não lhe maltratava e supria a casa com tudo o
que fosse necessário para a sobrevivência da família.
Mas faltava algo. Não
eram bens materiais. Queria sentir a paixão de um grande amor, pois pelo genitor
de seus filhos nutria tão somente respeito e consideração. Não o amava. Cumpria
seus deveres matrimoniais burocraticamente, sonhando, quem sabe, com um
príncipe encantado.
Um dia, surgiu
alguém que poderia tornar realidade o desejo tanto tempo reprimido. Cresceu
dentro de si a vontade de se arriscar, de se entregar a um amante, com quem,
mesmo que clandestinamente, poderia vivenciar momentos de ternura e
arrebatamento. Seria uma redenção? Ou uma fuga? Quem sabe um prêmio?
Nada disso. Somente
uma ilusão. Nenhum dos dois teve coragem de dar o passo definitivo, aquele em
relação ao qual não se tem volta, quando a sorte é lançada e atitudes tomadas
sem que as consequências fossem medidas. Ficou triste, mas logo se conformou.
Não havia nascido para aventuras.
Seu destino era
aquele mesmo: casa, trabalho, marido e filhos. Sem reclamar, sem sonhar. Apenas
o cotidiano de uma existência marcada pela simplicidade, na qual o inesperado não
se faz presente. Onde tudo é previsível, numa fachada de felicidade estampada
nos gestos comuns do dia a dia.
Às vezes,
porém, num suspiro mais profundo, o coração acelera e imagina, por instantes, como poderia
ter sido bom aquele caso fortuito e fora do padrão. Ao menos uma vez, como
teria sido bom.
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