sábado, 19 de setembro de 2020

Visão matinal

 


        Naquela hora da manhã não havia viva alma na praia.

 

          A alvorada ainda iniciava seu trajeto na linha do horizonte, mas o brilho solar já resplandecia em linha reta da água do mar até a areia, que, intocada, estava lisa e sem marcas, denotando a arrumação que a maré tinha feito ao longo da noite que se despedia.

 

          Subitamente, eis que uma jovem, pois não devia ter mais do que 25 anos de idade, desceu as escadas de concreto e imprimiu com os delicados pés descalços as primeiras pegadas no tapete até então imaculado da beira-mar, tal qual um Neil Armstrong em sua caminhada lunar.

 

          Com o balanço característico de quem desfila numa passarela de Milão, deixava os cabelos escuros como uma madrugada sem luar esvoaçarem ao vento nordeste, que desmanchava suavemente o elegante corte na altura dos ombros, brancos como a neve. Se tivesse saído das águas seria a revelação de uma sereia.

 

          Ao longe no perfil delineado superior ao de Galatéia esculpida em mármore, destacava-se o pequeno nariz arrebitado e os lábios que, surpreendentemente, naquele local e naquele horário, estavam cobertos por um batom mais vermelho do que uma brasa de fogo.

 

          De altura mediana, usava um biquíni preto, que, coberto por uma saída de praia alva e rendada, escondia/revelava as curvas suaves daquele corpo no zênite de seu vigor. Nas mãos, com dedos finos de pianista, trazia um celular. Logo, segurou o aparelho eletrônico à frente do rosto e, com os braços estendidos, começou a gravar um vídeo, pois movimentava a boca como se estivesse falando, não permitindo a distância que as palavras fossem entendidas.

 

          Gravou uma vez, não gostou. Apagou. Gravou novamente. Depois outra, até que se deu por satisfeita. Não durou mais do que cinco minutos. O que teria dito? Seria uma influencer destacando alguma questão ambiental? Ou apenas uma turista mandando uma mensagem para um amor distante? Quem sabe alguém preparando um material promocional do litoral capixaba? Nunca saberei.

 

          Satisfeita com o resultado, retomou calmamente o seu caminhar ondulante, e subiu novamente ao calçadão para sumir na primeira esquina.

 

          E assim começou o sábado.

 

 

 

 

 


 

         

 

         

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