segunda-feira, 4 de abril de 2022

Deboche

 

        Campanha política é um negócio (e bota negócio nisso) complicado.

 

        Reputações são destruídas, acusações feitas sem um mínimo razoável de comprovação e todos os lados envolvidos se consideram certos e qualquer um que pense diferente é o inimigo que precisa ser destruído, pisoteado e enlameado.

 

        Faz tempo que busco para minha vida um equilíbrio que se aproxime o máximo possível do caminho budista do meio, ou seja, como se diz popularmente, nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Não é muito fácil.

 

        Já tem alguns anos que na eleição presidencial eu voto no “seu nulo”, pois não vejo em nenhum dos candidatos anteriores e atuais condições de se arvorarem salvadores da Pátria, este ente tão utilizado nos discursos e propagandas, mas que continua sendo vilipendiado, sem que os maiores interessados, nós, o povão, tenhamos qualquer voz ativa na condução do seu destino, pois a nossa democracia ainda me parece próxima de um simulacro, tantos são os balcões disponíveis para negociatas.

 

        Talvez, por isso, Sir Winston Churchill tenha dito que “ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos”. Dessa maneira, qualquer ameaça à democracia, por mais defeituosa que esteja, precisa ser repelida com veemência.

 

        Queria passar ao largo desse assunto, mas me senti, porém, com a obrigação de escrever alguma coisa em relação ao insano, inconsequente e totalmente desprovido de qualquer sentido lógico comentário deletério que determinado parlamentar federal, cujo nome nem merece ser nominado, fez recentemente em relação à jornalista Miriam Leitão, que conheci em Vitória nos momentos de minha militância sindicalista juvenil, sem, naturalmente, a intensidade e denodo dela.

 

        Não posso dizer que tenhamos sido muito próximos, mas acredito que possamos, em algum momento, termos comungado dos mesmos ideais de fraternidade, liberdade e de um país socialmente mais justo, mesmo que os meios para se alcançar tão nobres objetivos possam ter sido vistos, naquela época, de formas diferentes por mim e por ela. Estou só conjecturando, pois tem muitos anos que não a vejo.

 

        Entretanto, o cerne da questão, a meu ver, é que nenhum ser humano, seja lá o que possa ter feito (até porque são muitos os pontos de vista sobre um mesmo tema), merece ser torturado, e não se pode dar o direito a outrem de supliciar seu semelhante. Respondem por este crime quem fez e quem ordenou. Inconcebível que uma pessoa, homem ou mulher, já presa (inclusive, de forma ilegal) e sem possibilidade de defesa sofra humilhações degradantes e, mais absurdo ainda, estando grávida. O que passa pela cabeça de tamanho monstrinho vestido de gente? Não consigo imaginar. E se os adversários da ditadura militar fizeram coisas do mesmo naipe, também merecem ser repudiados, pois, na forma que entendo atualmente, os fins não justificam os meios.

 

        Eu participei pouco de toda aquela luta, mais na fase final, das campanhas “Diretas Já”, “Anistia ampla, geral e irrestrita” e o fim da censura à imprensa, pois já militava nas redações. Tinha menos ou pouco mais de 20 anos, e sabia um mínimo de coisas do mundo e suas vicissitudes, como ainda não sei quase nada. Mas tem algo que sempre me indignou, talvez tanto quanto a violência como meio oficial de coação estatal: o deboche.

 

        O que aquele cidadão fez mancha sobremaneira o Parlamento, cuja reputação já não está essas coisas todas. Fosse esse um país sério, onde o debate ideológico observasse a dialética platônica, o mandato dele estaria cassado sem maiores delongas. É claro que isso é apenas um sonho de uma noite de outono. Mas dia virá em que a verdade será uma só, não por imposição, mas por uma consciência clara do que é efetivamente uma vida em comum numa sociedade onde todos têm tudo e a ninguém falta nada.

 

        Minha modesta solidariedade, Miriam Leitão.

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