quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

Presidente




        O porteiro aqui do prédio estava eufórico.

        Seu passarinho campeão de canto, com o nome “Presidente”, tinha sido vendido por 7 mil reais.

        Trata-se de um coleiro ou coleirinho ou papa-capim, espécie muito conhecida em todo o Brasil, com exceção da Amazônia, e um dos preferidos dos criadores brasileiros, mas também bastante perseguido pelos traficantes de animais por conta de sua qualidade canora.

        Não sabia que um bichinho daqueles pudesse valer tanto dinheiro. “Presidente” nasceu em cativeiro, e o espaço maior que conheceu foi uma gaiola para voo, com tamanhos de 62 x 24 x 34 centímetros, de madeira ou ferro, ou até um pouco mais compridas ou altas, utilizada para treinamento. Estima-se que existam 500 mil pessoas em todo o país que criam pássaros.

        Lembrei-me dos anos 70, quando também tinha o costume de manter coleirinhos em gaiolas. Era moda entre a garotada cada um ter seu pássaro, às vezes até uns dois ou três. Alguns meninos tinham alçapões e andavam pelos campos daquele interior capturando as aves, que depois eram objeto de trocas.

        O vendedor chegava com o coleiro e para passá-lo para a gaiola do comprador usava-se a seguinte técnica: encostava-se a janela de uma gaiola na outra e, assim, o passarinho mudava de “casa”. Uma das moedas mais apreciadas eram figurinhas do álbum de Telecatch, aquele dos lutadores Ted Boy Marino (a mais valorizada), Rasputin Barba Vermelha, Múmia e outros menos cotados.

        Uma vez adquiri um coleiro ao custo de um álbum completo. Encostei minha gaiola com a janela do lado esquerdo na janela do lado direito da outra gaiola onde estava o pássaro. Por descuido, porém, deixei a janela do lado direito da minha gaiola aberta e a ave simplesmente passou de um lado para o outro e sumiu no espaço infinito. Minha decepção foi tão grande que encerrei ali minha experiência juvenil nesta área.

        Tempos depois, já adulto e casado, aventei a possibilidade de comprar um canário para ter em casa. Minha mulher simplesmente disse que eu poderia até adquirir o pássaro, mas na primeira oportunidade ela iria soltá-lo. Em benefício da harmonia conjugal achei melhor não levar a ideia adiante. Tudo pela paz no lar.

        Enfim, criar pássaros, pelo visto, é uma atividade rentável. Talvez até tenha um caráter preservacionista, considerando o nível de destruição ecológica que vem acabando com o habitat de muitas espécies, não só de aves como também de mamíferos, peixes e répteis, tanto na terra quanto na água.

        Hoje em dia, porém, prefiro colocar diariamente umas bananas na mureta da varanda e ver belas aves coloridas, cujos nomes desconheço, apreciarem o alimento. E parece que se criou um costume, pois quando me atraso escuto um tipo de canto que mais parece protesto e exigência do que suaves melodias.

        Acho que fiquei, de alguma maneira, responsável por garantir o pão de cada dia deles. É o tal do cativar? Quem sabe!

       

       

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